sexta-feira, 12 de novembro de 2010

AG #9 : A politicização da Ciência, e a cientificação da Política.

Existe, desde há muito tempo, uma idealização do que deve ser a relação entre a política e a ciência, que consiste num modelo simples e eficaz, no qual a ciência produz verdades, publica os seus resultados no domínio público e depois a política decide o que fazer sobre isto. Pielke Jr chama-lhe o modelo linear de ciência e decisão, é bastante consensual, baseando-se na distinção "is-ought" de David Hume. De factos não se derivam valores e decisões, resultando em tarefas divididas.

Mas a sociedade humana não é assim tão simples. Desde logo porque um cientista é um cidadão, e também tem preocupações. Muitas vezes vemos cientistas altamente especializados não só a divulgarem as suas preocupações e achados científicos, mas também a promover opiniões (algumas incrivelmente ridículas) sobre como lidar com essas descobertas. Quando este fenómeno se prolonga, vemos cientistas a opinar política, mas também vemos a ciência, a observação de factos a servirem de argumentos políticos, resultando num ambiente no qual a ciência é política.

Isto é um erro crasso, e é algo que se observa de um modo incrivelmente extenso em todas as temáticas Ambientalistas. É um erro, porque a ciência transforma-se, inadvertidamente, num meio politico de ganhar apoios para determinados fins ideológicos, e porque depois se criam dois efeitos pérfidos.

O primeiro problema é a moralização da ciência, no qual o ambiente social dentro de determinado campo científico cria divisões entre quem está do lado "certo" e do lado "errado" não em termos científicos, mas em termos morais. Enquanto que o desconforto social de quem está errado empiricamente resulta sempre em melhor ciência, o desconforto social de quem está errado ideologicamente nunca resulta em grande coisa. Dito de outra forma, a pressão evolutiva é a errada, e criam-se feedbacks positivos preocupantes, gerando mitos e medos catastrofistas que pouco mais são do que exageros brutais de fenómenos reais. What the Green Movement Got Wrong foi um documentário feito por Mark Lynas, um ambientalista de renome que repensou muitos dos mitos que tinha por verdades quase absolutas, tais como o Nuclear e as GM serem maléficas. Mark, o mesmo tipo que disse “I wanted to put a Baked Alaska in his smug face", referindo-se a Lomborg, por defender também coisas atípicas de um "bom ambientalista".

Mas há muitos mais exemplos interessantes.

a. Chuvas ácidas

Quem não se lembra do horror das chuvas ácidas? Eu já nem me lembrava, até ler este artigo muito bem escrito no The Times:

We have been here before. In 1984, acid rain was the environmental scare of the day. As the science correspondent of The Economist, I wrote: `Forests are beginning to die at a catastrophic rate. One year ago, West Germany estimated that 8% of its trees were in trouble. Now 34% are...that forests are in trouble is now indisputable.’ Experts told me all Germany’s conifers would be gone by 1990 and the Federal Ministry of the Interior predicted all forests would be gone by 2002.

Bunk. Acid rain (though a real phenomenon) did not kill forests. It did not even damage them. Scientists eventually admitted that forests thrived in Germany, Scandinavia and North America during the 1980s and 1990s, despite acid rain. I was a gullible idiot not to question the conventional wisdom I was being fed by those with vested interests in alarm.


b. Espécies em Vias de Extinção.

Sugiro a leitura de outro blog excelente de um especialista na matéria, liberal de pensamento (leia-se: de esquerda), Stephen Budiansky:

The astonishingly wrong and repercussion-free prediction of imminent doom that first riveted my attention was the claim of the impending mass extinction of the Earth's species. In 1979, the biologist Norman Myers declared that a fifth of all species on the planet would be gone within two decades. This prediction was based upon . . . absolutely no evidence whatsoever. Myers acknowledged that the documented species extinction rate of animals was 1 per year; he then asserted that scientists had "hazarded a guess" that the actual rate was 100 per year; he then speculated that government inaction was "likely to lead" to several thousand or even tens of thousands a year, which would add up to as much as a million species over two decades. (This was when people thought there were 5 million species; the best guess now is at least 10 million.) It swiftly became conventional wisdom.

Subsequently, an attempt was made to give these made-up numbers a patina of scientific respectability that was in many ways an even worse abuse of scientific logic and evidence. In the 1990s E. O. Wilson began citing the so-called "species–area relation" as the basis for predicting that tens of thousands of species were being extirpated a year by habitat loss caused by forest clearing. Wilson popularized various numbers ranging from 4,000 to 100,000 species a year being lost, and these numbers were repeated over and over again in environmental groups' fundraising literature, in congressional testimony, in speeches by Al Gore (who in 1993 said that "one-half of all species" could disappear in our lifetime, apparently an extrapolation of Wilson's and Ehrlich's pronouncement, in a 1991 paper in Science, that as many as a quarter of all rain forest species will disappear in 30 years).

Read more: http://budiansky.blogspot.com/2010/09/teflon-doomsayers.html#ixzz157VcaKFL


c. Acidificação dos oceanos

Argumento ainda em voga. Excepto de que é uma patetice, conforme descoberto pelo autor do livro "Rational Optimist" (outro Lomborg?):

The scary reasoning rests on the argument that lower pH will mean less dissolved carbonate in the water. But a new paper from scientists in North Carolina proves what many scientists have long suspected, namely that corals and other species do not use carbonate as raw material to make their shells; they use bicarbonate. And dissolving carbon dioxide in water actually increases bicarbonate concentrations.
(...)
This may explain why study after study keeps finding that far from depressing growth rates of marine organisms, high but realistic levels of carbon dioxide either do not affect them or increase them.
(...)
When I voiced some of these doubts in my book The Rational Optimist, I was accused of cherry-picking studies. All right, so let’s take a look at a `meta-analysis’, that is to say a comprehensive paper summarising all relevant studies. Iris Hendriks and Carlos Duarte of the Spanish Council for Scientific Research found that in 372 studies of 44 different marine species `there was no significant mean effect’ from lower pH. They concluded that the world’s marine biota are `more resistant to ocean acidification than suggested by pessimistic predictions’ and that ocean acidification `may not be the widespread problem conjured into the 21st century.'


.... e no entato é um dos argumentos mais usados na internet, como uma espécie de "backup" para quem não leve demasiado a sério o aquecimento global, "e atão a saúde dos oceanos?"

Podíamos continuar a noite inteira nisto. Os DDT que eram "venenosos", a camada de Ozono que aparentemente não é tão sensível aos CFCs como pensávamos, etc., etc., etc.

A questão mais pertinente é, em que é que uma ciência ideológica, i.e., Ambientalismo, consegue sequer acertar?


O segundo problema é a transformação de uma aceitação de factos para uma escolha de factos. Ou seja, se a ciência se torna politicizada, então quem se opõe ao projecto sugerido por quem está do "lado da ciência" não só se oporá à política, como sobretudo à ciência. E este fenómeno acontece apesar de qualquer ciência discutida. E se a esquerda é tradicionalmente ambientalista, isso não se deve a uma maior preocupação perante o meio ambiente, mas sim a uma visão política estatista e anti-corporativista. O ambientalismo cai que nem uma luva nesta ideologia, e entra-se numa narrativa na qual as grandes mega-corporações internacionais nos estão a lixar o planeta, é necessário mais controlo, mais regulação, etc. O Ambientalismo não é um objectivo da Esquerda, é uma ferramenta. Agora, se a direita é tradicionalmente céptica a qualquer ambientalismo, isso não se deve a um total egoísmo e irracionalidade da sua parte, mas sim a uma desconfiança milenar sobre o controlo estatal e a sobre-regulamentação, corrupção e deturpação de mercados que resultam sempre dos planos ambientalistas. A objecção não é científica, é política, e eu penso que este é um equívoco grave que deve ser corrigido.

O resultado é uma manipulação constante da ciência, poluindo não só as suas práticas como minando a sua respeitabilidade. Por outro lado, o desenvolvimento de uma ideologia anti-capitalista e anti-humanista como uma visão respeitável do futuro, substituindo outras visões ideológicas mortas, essas sim humanistas e positivas.

Mas este século não é um de Sonhos, Visões, mas sim um de Pesadelos.